O câncer não espera: por que o Amazonas precisa de um centro de diagnóstico já.

Artigo

Dr. Gerson Antônio dos Santos Mourão – Diretor-Presidente da Fundação Centro de Controle do Câncer do estado do Amazonas (FCecon)

O Amazonas, maior estado brasileiro em extensão territorial, convive com um desafio que já se tornou conhecido como o “fator amazônico”: a imensidão geográfica, os rios que funcionam como estradas e a dificuldade logística para chegar a serviços de saúde especializados. São mais de 1,5 milhão de km² e 4,28 milhões de habitantes, metade deles concentrada em Manaus e a outra metade espalhada em pequenas comunidades pelo interior.

Essa realidade pesa de forma dramática no tratamento do câncer. Hoje, cerca de 70% dos pacientes oncológicos no estado recebem o diagnóstico já em estágio avançado. As chances de cura diminuem, os tratamentos se tornam mais caros e dolorosos e, muitas vezes, o desfecho é inevitável. Não é por falta de tecnologia – o Amazonas conta com cirurgias, quimioterapia e radioterapia -, mas por falta de diagnóstico precoce. Atualmente, apenas a Fundação Centro de Controle de Oncologia do Estado do Amazonas (FCecon), em Manaus, é referência pública para toda a região. O hospital atende não só amazonenses, mas também pacientes vindos de outros estados do Norte e até de países vizinhos.

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O problema não é local, mas global. A previsão é que o número de casos de câncer no mundo suba de 20 milhões em 2022 para 30 milhões em 2040. Metade dessas pessoas morrerá simplesmente por não ter tido acesso a um diagnóstico precoce. Como lembrava Einstein, “é insano fazer sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes”. Continuamos tratando pacientes em estágios avançados, como já acontecia no século XVIII, quando mutilações e longas internações eram comuns, e, apesar dos avanços da ciência, muitos ainda não sobrevivem.

É nesse contexto que surge uma proposta inovadora: a criação de Centros de Diagnóstico do Câncer no Amazonas. O objetivo é descentralizar e agilizar o atendimento, oferecendo exames e biópsias logo nos primeiros sinais da doença. A ideia é simples, mas transformadora: dois centros, um em Manaus e outro em Tefé, cidade localizada no coração geográfico do estado. Ali, pacientes do interior teriam acesso à triagem e ao diagnóstico, sendo encaminhados à FCecon apenas para o tratamento especializado.

A escolha de Tefé tem um simbolismo forte. Representa aproximar a saúde das populações ribeirinhas e interioranas, reduzindo distâncias e desigualdades. Para o Sistema Único de Saúde (SUS), o ganho também seria significativo: diagnósticos precoces significam tratamentos mais curtos, menos mutilantes e mais baratos, resultando em economia e sustentabilidade. O impacto seria duplo: salvar vidas e poupar recursos do SUS. Tratar cedo custa menos, mutila menos e dá mais dignidade. É uma economia que se mede não apenas em cifras, mas em esperança.

O Centro de Diagnóstico, quando for efetivado, não será apenas mais um prédio de saúde. Será um divisor de águas. Um grito contra a lógica perversa de deixar que a doença avance para depois correr atrás. E, acima de tudo, será um compromisso com a vida, a vida amazônica, a vida brasileira.

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