Entrevista com o presidente do CNPq, Ricardo Galvão, sobre a ciência e a Amazônia

Durante a posse da reitora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Tanara Laushner, (4-7), o Portal Cultura Norte entrevista  o presidente do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), Ricardo Galvão, que analisou as questões ambientais, os povos amazonidas, e como a ciência é estratégica para o enfrentamento às questões de ameaça e o desenvolvimento sustentável da região.

CN – A Amazônia tem o arco do desflorestamento, o arco do fogo, por onde é ocupada e ameaçada, que fica no sul do estado com quatro municípios. O acha que essa região pode ser melhor estudada e tratada de forma estratégica?

Ricardo – Sim, primeiramente o que nós chamamos do arco de desmatamento, ele começa já quase no estado do Maranhão, desce por todo o sul do estado do Pará, do estado da Amazônia e vai até o Peru. E, inclusive, um nome que foi dado por uma grande geógrafa brasileira, que é a Berta Becker, que se preocupava com o desenvolvimento da Amazônia. E, nós estamos cada vez mais vendo o avanço do desmatamento, inclusive explorado não somente com a agricultura de soja, mas também, com a questão de cada vez mais a produção de carne sendo influenciada. E por isso, é uma maneira importantíssima de resistir, primeiramente através da ciência. E nós temos que fazer o desenvolvimento científico localmente nós temos que cada vez mais fixar cientistas na Amazônia com boas condições para trabalhar; claro que não basta só isso, há necessidade que os polos tomadores de decisão, escutem a

ciência e avancem. Nós temos ainda problemas muito sérios, mesmo agora no governo atual, algumas divisões sobre a questão da farsa da rodovia 319 que a ministra, Marina Silva, foi infelizmente, de uma forma muito desagradável, atacada; mas essas coisas têm que ser resolvidas com base no conhecimento científico, com base em decisões que sejam para o benefício do país e tomada com conhecimento. Às vezes nós temos uma paixão muito grande de um lado ou de outro e esquecemos de ver as bases. Nós temos lá no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) um levantamento muito grande da emissão de gases de efeito estufa. E nós fazemos medidas, o pessoal do INPE faz medidas, em quatro regiões da Amazônia, com aviões que voam muito alto. A Amazônia, 15 anos atrás, os estados da Amazônia principalmente, era um absorvedor de gás carbônico da atmosfera. Hoje, nós já temos a região leste da Amazônia emitindo mais gás carbônico. Isso tem uma consequência enorme para o país, consequência nefasta para o país, principalmente agora com a questão do aquecimento climático.

CN – Como é que o senhor coloca a região no seu radar do CNPq, junto com as instituições de pesquisa que têm aqui?
Ricardo – Nós já temos tomado iniciativas, inclusive, no ano passado lançamos um edital muito importante de levantamento da biodiversidade em toda a Amazônia. Temos discursões científicas em que todos os dados, inclusive, têm

que ser guardados em instituições amazônicas. Então nós estamos primeiro promovendo o conhecimento, o nosso conhecimento da biodiversidade. E, mais importante que isso, não é só o conhecimento científico tradicional, mas também o conhecimento dos povos originários e também estudar medidas para um desenvolvimento sustentável que atenda a população. Nós não podemos ter uma população de 30 milhões de habitantes sem ter o que fazer. E, por outro lado, é muito claro que a biodiversidade amazônica oferece muitas oportunidades se for muito bem explorada. Nós acabamos de fazer, estamos fechando agora um acordo com a França, o Centro Brasil-França da Biodiversidade da Amazônia, incluindo principalmente a Guiana Francesa, o estado do Amapá e toda a Amazônia Norte, para explorar isso, e para achar, encontrar medidas que, baseadas nas ciências, e permite uma exploração que não seja predatória para a nossa querida Amazônia.

CN – Já que o senhor falou no Alto Rio Negro, a gente tem lá e no Alto Solimões as duas maiores diversidades étnicas, talvez do planeta. A gente está olhando com o cuidado devido a essas regiões? Ricardo – Estamos olhando mas não como deveríamos. Tem muito a melhorar. Por exemplo, eu estive agora, dois meses atrás, em Roraima. Então, a Universidade Federal de Roraima (UFRR) acabou de lançar, inclusive, está desenvolvendo um hospital bastante grande, hospital

indígena. E tem universidade também para os indígenas. Espero que a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) também vá para essa [direção], cada vez mais assim, porque sem o conhecimento as pessoas não sabem o que fazer. Infelizmente as redes sociais, hoje em dia, levam à descrença da ciência, então por isso é importantíssimo investir no conhecimento.

CN – O seu colega de ciência que já nos deixou, o professor Ennio Candotti, teve a iniciativa de fazer o Musa, o Museu da Amazônia. O senhor acha que a Amazônia tem realmente um grande museu à altura dela?

Ricardo- Ainda não. Primeiro eu quero fazer uma homenagem ao meu grande amigo, o Ennio Candotti, um amigo de muitos anos. Fiquei emocionado quando o senhor falou no nome dele. Estive aqui com ele, visitando o Musa. Até lembro-me, quando ele resolveu fqzer o Museu da Amazônia, falei, que vai se fazer lá? – Eu vou fazer um trabalho importantíssimo! respondeu ele. Estive aqui com ele. Nós ainda não temos [museu]. Mas, pelo outro lado, nós temos instituições como o INPA (Instituto Nacional Pesquisa da Amazônia), que tem muita coisa pesquisada. Nós estamos ajudando e tem grandes possibilidades de desenvolver.

 

Texto e fotos; Cristóvão Nonato

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